segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Ainda é possível falarmos de verdadeiros instrumentistas?

Há muito que gostaria de falar sobre este questionamento, entretanto, compreendo que a pergunta não é totalmente clara. Porém, há muito, não busco, pelo menos por aqui, fazer-me claro nas coisas que digo.
O título de saída diz respeito, especificamente, aquele músico especialista em um instrumento só. Digo só no sentido do individuo ser “guitarrista”, “baixista”, “trompetista”, etc. Não que eu seja adepto ou árduo defensor que o músico deva se cerrar nos timbres e sons de um único e solitário instrumento. Não! Mas minha dúvida – sim, é uma dúvida ingênua, criada por mim mesmo intencionalmente – se construiu ainda na adolescência, quando iniciei meus estudos musicais e que sobrevive ainda hoje, talvez com uma maturidade maior e uma possível percepção melhor do contexto histórico que vivemos todos nós.
Me recordo que lá pelos idos dos anos 90, quase no final da década, eu queria ser um guitarrista, ter uma banda de rock, tocar, me “rebelar”, como diria Pepeu Gomes, “fazendo música e jogando bola”.
De uma família protestante, a música era, inevitavelmente, instrumento vivo e real de exaltação do Deus morto na cruz e ressurreto três dias depois. Sendo assim, formar uma banda de rock, música do demônio – eterno inimigo das tropas cristãs, sejam católicas ou protestantes – seria demasiado difícil e doloroso. Há de ressaltar, é claro, que essa apostasia de considerar o bom e velho rock como música do demo é a maior palhaçada que eu já ouvi!
Mesmo assim, iniciei os estudos, afirmando para meus pais ser meu objetivo engrossar as trincheiras contra o mal através da “lira de Davi”, no caso as seis cordas de uma guitarra que ganharia no aniversário seguinte, a contra gosto da minha mãe. Porém, os primeiros passos foram dados no violão que estava largado na casa do meu primo-irmão, e foi com um professor chamado Renato, que, na verdade, era um tecladista batista que tinha uma conhecida passagem num famoso grupo gospel das antigas chamado Logos, que iniciei o aprendizado. Grupo, aliás, que exerceu forte influência em minha religiosidade enquanto estive ligado a instituição Igreja, um, pela qualidade da música que faziam e, dois, pela consistência teológica de suas letras.
Me lembro dos primeiros passos, dos três primeiros acordes que, surpreendentemente, me renderam uma canção simples logo quando cheguei em casa depois da segunda aula. Estudava com afinco aquele instrumento, cujas cordas eram invertidas por ser eu canhoto, o que no futuro geraria grande e grave problema quanto a emprestar ou pegar emprestado violões e guitarras.
Enfim, minha idéia era essa: tocar bem, muito bem, um único instrumento, levando em consideração que eu não fazia distinção entre a guitarra e o violão. Aliás, iniciar meus estudos de guitarra pelo violão já muito me chateava e a desculpa do professor de que era o passo mais correto não me convencia. Com o tempo e a maturidade, percebi que foi o caminho mais sensato a se tomar, já que, sim, são instrumentos diferentes.
Outra coisa que me incomodava era o fato de Renato ser tecladista, algo que só descobri mais tarde quando conheci outro tecladista do grupo Logos, o que acabou se tornando meu grande mentor em assuntos musicais: Elber. Na verdade, continuo com esse preconceito, eu, verdadeiramente, não estudaria ou aconselharia alguém a estudar baixo com um cara que não tem no contrabaixo seu instrumento “base”, principalmente, se você já tem as “manhas” de ter aula particular. Isso aconteceu comigo, acho que em 2006, início de 2006, quando adquiri uma flauta transversa e procurei aula com alguém, fiz apenas uma, pois o cara era saxofonista e só ficava no “migué”. Preferi estudar sozinho mesmo, claro que ainda hoje espero o método que Gustavo me prometeu de presente, talvez, um dia eu ganhe! Mas o que tenho aqui em casa tem dado para o gasto... Continuemos, pois a introdução é longa e realmente demorada.
Com um ouvido finíssimo, o que em música chamamos de absoluto, esse meu amigo, estudava regência na Universidade do Rio de Janeiro (Uni-Rio) e era o segundo dos muitos alunos a ter esse dom na sua turma, digamos, divino. Com ele aprendi o termo “instrumento base”, aquele que é teu instrumento de estudo. E acabei, através das muitas conversas com ele, tecendo o termo que hoje chamo de instrumento(s) secundário(s), que explicarei mais para frente.
Na universidade, Elber estudava regência, tendo sido aprovado no exame de habilidade especifica em piano, contudo, o curso possibilitava a escolha de um segundo instrumento, no seu caso, a flauta transversa.
Entretanto, conforme os anos iam passando e nossa amizade se tornando mais forte e fiel, fui percebendo que o músico dominava quase todos os instrumentos que pegava: violão, bateria, guitarra, contrabaixo, etc. Para mim, algo fora do comum, para ele e diversos outros músicos: normal. Lógico que o instrumento, sensivelmente perceptível, que ele tinha mais domínio e afeição era o teclado, ainda mais que o piano, utilizado para a prova.
Por tecladista, verdadeiro tecladista, entenda-se nos dias atuais: arranjador. Sou obrigado a dar o braço a torcer que, ainda, hoje, são eles, com raras, raríssimas exceções, como Luis Cláudio Ramos, os melhores no quesito produção e arranjo, distinguindo aqui as duas etapas. É certo que meu amigo tinha um passo a mais que muita gente de música: o ouvido absoluto, o curso universitário de regência, o conhecimento popular, dentro e fora do segmento cristão (Elber é filho de pastor batista), uma cabeça aberta para novas sonoridades e ritmos e, enfim, o conhecimento clássico.
Isso me faz lembrar de vários nomes como César Camargo Mariano, Wagner Tiso, o grego Yanni e, lógico, o maior de todos os maestros: Antonio Carlos Jobim – que na minha opinião é maior que Heitor Villa-Lobos.
Abandonei então os estudos de guitarra e iniciei um estudo sistemático do baixo de quatro cordas, com um ótimo contra-baixista de seis cordas. Pensei, enfim, ser aquele meu instrumento base – a guitarra e o saudoso violão ficaram como secundários. Uns dois anos de estudo, dificultados pelo fato de, com a tal maturidade, ter decidido não inverter as cordas do instrumento, mas, apenas invertê-lo, e entrei numa banda cristã tocando, sic, guitarra e contra-baixo.
Mas as dificuldades no diálogo entre os meus amigos de banda foram muitas e não eram simples de se contornar na fase em que nos encontrávamos, 16, 17 anos: a educação musical. Após ouvir o que poderia chamar de nata do Heavy Metal, não queria trabalhar coisas simples, na verdade, eu já estava, inclusive, migrando para segmentos mais “dissonantes”, redescobrindo inúmeros sons que iam do samba, bossa nova, música regional e o próprio Heavy mais elaborado, ou seja, já não tinham mais escamas nos meus olhos e meu ouvido necessitava de mais e mais sons. Entendia, assim, que aquilo era a necessidade de conhecer novos timbres, instrumentos, formas de compor e escrever música. Fiquei só.
Volto então ao questionamento ingênuo: Globalização? Necessidade de criação? Leque de possibilidades? Não correr risco de ficar desempregado no meio musical?
Sei que a introdução à minha futura hipótese que tentará responder tais perguntas foi longa, muito longa, mas acho que vale o sacrifício.
Analisando os instrumentistas da classe dos sopros, por exemplo, que, há uns três anos passei a “freqüentar” já que abandonei as cordas e as teclas e decidi tomar como instrumento base a flauta transversa, percebi que apesar de ser um fenômeno um tanto tardio, marcado, na minha opinião, na década de setenta, atualmente não encontramos um flautista simplesmente.
Na verdade, temos num único músico de sopro, uma flauta, um clarinete, um sax alto e soprano. Acho que um bom exemplo pode ser o talentoso Marcelo Bernardes que toca há muito com Chico Buarque. Poderia, claro, citar outros, mas me fixo apenas nele. Acho que esse exemplo atende a primeira (globalização instrumental) e a segunda pergunta (não ficar desempregado).
Bom exemplo, passando para o rock/pop, de multi-instrumentista seria o grande Phil Collins, eterno baterista do Genesis, mas que no entanto toca outros instrumentos e faz jus em dominá-los. Acho que ele responde a segunda e terceira perguntas.
Então, solto mais uma vez minha voz pelo ar e me questiono, sem uma real conclusão: Ainda é possível falarmos de verdadeiros instrumentistas? Ou a proposição deve ser a de que a pergunta se fixa apenas em trompetistas que necessitam de uma embocadura essencial e que não se adapta à flauta por exemplo, a não ser que o individuo seja bastante esforçado – alguém aí já tentou tocar trompete? A própria flauta transversa tem suas nuances bocais...
Em música há uma explicação, um termo para tal situação, o fato de um clarinetista conseguir sem muito estudo ou dificuldade tocar sax, etc. Ou o fato de um guitarrista conseguir tocar, talvez não com a mesma habilidade, o contrabaixo e vice-versa. Nesse último caso, talvez, penso eu, por muitos baixistas começarem os exercícios de digitação e escalas no braço do violão. Ou, enfim, um violinista conhecer os caminhos o cello e por aí vai, mas fico por aqui, pois não me lembro o termo exato que explicar essa “irmandade” entre alguns instrumentos musicais.
O que me resta é concordar muito simploriamente que a música nos leva por diversos caminhos, ritmos, sons, timbres e, inevitavelmente, instrumentos. Mas defendo: melhor tocar muito bem um instrumento só que tocar razoavelmente diversos. Afinal, não estamos mais fazendo cursinho pré-vestibular, não é verdade?
Outra coisa: um caminho ótimo e não nos cerrarmos simplesmente a um segmento. Conheço ótimos músicos de Heavy Metal que tem um exímio conhecimento de outros estilos como bossa nova, samba e poderia citar aqui inúmeros outros ritmos e formas de composição. Talvez isso me gere uma outra dúvida inocente: O que são os estilos?
Acho que é só. Pois música é, simplesmente, ritmo, harmonia e melodia. Alguém discorda?

2 comentários:

Maria Quitéria disse...

Bem, querido, o instrumentista, deveria ser o cara que toca um instrumento, certo? Então, se ele toca gaita, fole, pandeiro, é instrumentista. Tem aquele garoto, Caio Mesquita, se não me engano, que toca MUITOS instrumentos, então esse é um INSTRUMENTISTA que toca a múscia instrumental em estilos diversos. Sei lá, acho que o importante é tocar, eu, por exemplo, toco moscas (perdoa! rs). Obrigada por ter estado comigo o ano passado. Embora atrasada, desejo um novo ano de realizações, grandes letras e que possamos interagir, novamente, em carinho e inspirações. Beijo

Andre de Lemos disse...

sei lá... Instrumentista... Acho que se é músico o instrumento é só o veículo através do qual um músico se expressa. Pode ser um violão, uma guitarra, baixo, piano, panelas, porquinho etc... quer dizer, já viu o Hermeto Pascoal fazendo solo de chaleira? É mais ou menos por aí que eu penso.

Além do mais, há certas características nossas que acabamos projetando para os instrumentos que escolhemos. Que nos fazem permanecer "fiéis" a um ou outro. Rola identificação, pois os mais encabulados podem escolher o contrabaixo, que é mais "na dele", ou uma guitarra, que é mais "exibida", como forma de vencer a timidez. Ou a bateria pq ela chama atenção quer vc querira ou não. Ou será são os instrumentos que nos escolhem? É uma outra possibilidade dentre inúmeras.

Enfim, valeu pelos comentários sobre o meu texto... Espero que goste dos outros tb... E continuemos a procura de algo... Sempre.

Abs...