quinta-feira, 19 de novembro de 2009

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Agora pouco me dei conta de que estou me sentindo solitário. Na verdade, um misto de cansaço com vontade de sobreviver é o que não cala minha voz. Deitei-me na cama, mesmo estando calor, senti frio, eu senti frio! O curioso é que não consigo mais chorar. Dia desses comentei com Ana o medo de me acostumar com a solidão, expliquei o quão difícil tem sido, e sei que o é para todos nessa vida. Mas, apenas não posso me permitir ao costume de ser só. Já fui demais sozinho.
Estou com insônia, pensei em ir caminhar, mas meu joelho dói um pouco e a merda da canela que o inseto no Maranhão mordeu, passou ou sei lá o que, ainda me incomoda um pouco – estou ficando velho, isso também me incomoda. Fiz torradas. Pensei em ir ao mercado comprar vinho. Desisti e sentei aqui para conversar com você que nem sei de onde é. Nem sei se existe alguém, fora meus amigos, que perde tempo em passar por aqui. Outro dia até me surpreendi quando um aluno meu comentou de vez em quando dá uma passada aqui...
Mas que dói, dói – a solidão. Sentei na cama e olhei a janela. Os carros cessam, a rua esvazia – todos no fundo, no fundo, são tão solitários como eu e você. Você que perdeu certo tempo por aqui. Mas a solidão é um fio de poema, sabe? Uma linha inconstante numa bizarra sintonia harmônica entre o dito e o não dito.
Mais cedo chorei por coisa boba. Boba mesmo. Veja só e eu que acabei de dizer que já nem sei ou lembro mais o que é chorar. Está certo, na verdade, não cheguei exatamente a chorar, isso me preocupa, mas me deu um arrepiozinho. Ouvindo The Smiths, acredita? Até ensaiei um tese sobre isso. Resolvi a tempo as minhas próprias hipóteses chulas. Conversei com meu primo Gustavo sobre o que há no grupo, nas melodias e nas letras que fazem gente como eu e ele se fixar naquilo. Chegamos à conclusão de que, no fundo, aquilo está no nosso subconsciente, num momento, num espaço da memória, da gente se arrastando no chão da varanda empurrando carrinhos ou brincando na base espacial do Playmobil, daí a gente cresceu, aprendeu música ou pelo menos a tocar alguns instrumentos e tem essas bandas que nem são lá essas coisas, mas que pegam a gente pelo pé. Há certa lógica no que formulamos. Curioso isso. Pois darei um salto estrondoso agora.
Há dois dias, deixei um amigo no aeroporto. Comigo ele deixou o carro, três textos para eu ler e criticar e dois cd’s do Astor Piazzolla para eu ouvir: “ouça a noite”, disse ele, com um riso sarcástico. Estou ouvindo agora Libertango, de 1974, e ele estava certo no que disse. Preciso de um vinho.
Não preguiça no meu corpo, se eu estivesse agora no Rio de Janeiro, nem sei o que estaria fazendo, talvez, a mesma coisa que faço agora: uma busca incansável pelo sono. Busco tanto que canso e resolvo fazer algo produtivo: ler um livro, pesquisar para o doutorado ou refazer os meus cálculos salariais.
Não que o Astor Piazzolla é bom mesmo? E olha que eu nem lembrava. Ouvi pouca coisa dele. Tai algo bem feito e que só bem feito pelos argentinos: o tango! Pois bem, relembro mais uma vez desse aluno que comentou que lia esporadicamente O Ventríloquo, acho que conseguirei explicar para você, meu camarada, o que eu não consegui dia desses, sobre como ouvir Alceu Valença aqui é completamente diferente de ouvi-lo no Rio de Janeiro, imagino até que seja mais diferente ainda ouvi-lo em Pernambuco. Bom, dá para te explicar com o seguinte: feijoada aqui em Sergipe, não é feijoada carioca. Ah, e carioca não como feijão carioquinha! Ouvir tango aqui, não tem o mesmo sentido que ouvi-lo em Buenos Aires. Ou seja, é ver Fla X Flu no Batistão... Ou Vasco e Flamengo no Couto Pereira. É diferente. Assim, como o forró e as festas juninas no Rio nunca, mas nunca mesmo serão tão boas como as festas sergipanas. Alceu é Alceu em qualquer lugar? Tango é tango em qualquer lugar? De certa forma, sim. Mas o sentido do não dito é outro.
Aliás, tenho ficado muito com o não dito ultimamente e me pergunto até que ponto o não dizer fala mais do que as palavras. É como esquecer de regar as flores que você não tem no jardim? Pode ser. Isso só entrou aqui, pois achei uma frase bonita. Pois o sentido, o sentido é o do não dito. Acho que o sono bateu.

Um comentário:

Anônimo disse...

Pois durma o sono dos justos, camarada. E que Deus te inquiete pra nunca se acostumar com a solidão...