quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Sentar no portão ou ecos de solidão

Somos feitos de muitas vozes, o som é surpreendentemente um dos nossos primeiros contatos com a vida, pois no seio materno é ele que nos comunica com o externo. Por isso, precisamos falar, conversar, gritar, cantar, emitir sons, imitar sons, produzir sonoridades diversas. Como pássaros, assoviar melodias, como flauta, fazer do sopro uma canção.
Isso é um grito. Cada pensamento aqui, ora solto, ora amarrado, é um grito, é uma conversa comigo mesmo e com os poucos que passam por aqui – nunca houve necessidade de outras pessoas passarem por aqui. Mas preciso de gente, pois sou gente.
Atualmente ando gente sozinho. Sou, praticamente, no meu dia a dia, também um ventríloquo. Agora pouco, me lembrei de me sentar no portão na época de menino no Rio de Janeiro. Tempo em que andava descalço pelo quintal, jogava bola na rua com os pés desnudos – tempos outros.
Conversas magníficas travei no portão de casa. Com amigos idos, uns mortos pela violência carioca, outros ainda no mesmo morro no qual me criei e saí para vida. Muitos não entendem minha relação com o mundo – minha relação é essa: era descer e subir diariamente, depois de um dia de estudo e depois trabalho, uma colina mediana e mais quarenta e três degraus de uma escada que me traz saudades – enfim estava em casa. Era essa minha relação com o mundo que vivia aos meus pés. O mundo que sempre vi lá de cima do morro da Chalé – referência que as pessoas de baixo faziam à Rua Chalet, onde morei toda minha vida e que se inicia plana e transforma-se em ladeira.
Hoje subo dez andares de elevador. Brinco ainda morar no morro e por querer sentir isso converso – ou tento conversar – com todos. Dos vizinhos se ganho um bom dia é muito, no elevador é aquele sentimento vazio de mesmo com três, quatro pessoas naquele cubículo quadrado e apertado, estar só. Não por isso, não só por isso, prefiro os funcionários do prédio. Mesmo que a hierarquia social do mundo os afaste de mim, tento buscá-los para perto. Talvez, o rapaz que recolhe todo santo dia o lixo de cada apartamento do edifício que eu moro não entenda isso em mim. Mas o seu “boa tarde” com o sorriso aberto é muitas vezes o momento mais alegre do meu fim de manhã e inicio de tarde. Ao seu “boa tarde”, respondo sorrindo “como você está meu camarada? Tudo beleza?”. E assim é com os porteiros do condomínio, com o trocador de ônibus, com a caixa do supermercado... com meu reflexo no espelho: “Tudo bem meu amigo? Tudo bem com você hoje, meu camarada?”. Pois a todos, trato de "amigo", mesmo não sendo eles, ainda, meus amigos. Mesmo que não sejam nunca meus amigos.
Isso é um grito. Meu grito para a solidão. Pois amanhã acordarei só. Amanhã, almoçarei só. E a gente vai se acostumando a não sentar mais no portão. A gente vai se acostumando na vida com os ecos da solidão.

4 comentários:

Aquino Neto disse...

só tenho 1 comentário:
-Vamo tomar um chopp rapá? topa?
^^

Aquino Rego disse...

Vamos tomar um chopp? [2]

Diego Viana disse...

Doutor Álvaro, num instante você já vai estar gritando entre amigos por aí, pode ter certeza!

G. Alvaro disse...

Só pra constar: Alvaro.

Sem acento.

Não nos proparoxítone.

Não devemos nos proparoxitonizar.

É Alvaro, sem acento.

Ceda o lugar, para nos sentar.