quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Verdade e Literatura ou O Dente de Leão que somos todos e A melhor publicação que participei em dois mil e quatorze (A volta dos Zines que nunca deixaram de ir e voltar)

A foto tomei de assalto da página do Café com Veneno (corre lá)



Numa dessas estradas de barro vermelho e batido, esburacada pela chuva e pelo vento, estreita como a vida. Numa dessas estradas que nos levam a lugar nenhum ou a todos os lugares. Nessas estradas em que você morre ou que você se encontra. Numa dessas estradas me lembrei de você. O sorriso se esvaiu e o silêncio imperou em todos nós. A vida que escorre e vida é vida. Me lembrei de você e me obriguei a parar. O corpo já sem ar com um dos olhos para fora, pequeno, tão frágil, quase do mesmo tamanho de quando você chegou lá em casa assustado e quebrou um pedaço do São Amarante que fica no móvel de som, naquele instante, nos amamos e nos demos bem, dei-te o nome de Gregório, o nome você já tinha. O Gregório já existia. Por isso lembrei de você quando vi aquele bichano cinza e rajado morto na estrada quieta e escura de um lugar da Bahia, por isso desci e retirei o corpo que poderia ser teu, após saltitar caçando um rato, uma barata ou outro inseto qualquer. Ficamos todos em silêncio. A barriga mole me lembrou a tua para cima pedindo carinho e atenção. As listras dos pelos me lembrando o brilho do amarelo e branco que é só teu – eu sei que existem milhões de vira-latas como você, mas você é só meu e eu sou só teu. Eu no meio do silêncio ouvi você reclamando, miando para eu correr atrás feito um bobo, imbecil e ignorante que sou. Correndo com você pelos cômodos da casa fazendo voz de pateta ou coisa do tipo. Foram alguns minutos parado, vendo a vida que se foi e vida é vida.

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Um dia queria conversar com você sobre o que eu disse um dia: Talvez a Literatura diga mais verdades que qualquer outra manifestação (como a História com H maiúsculo, por exemplo, ou mesmo aquela com h minúsculo, precisaria aqui de uma nota para a minha divagação, não o tenho). Talvez, num conto, eu diga a verdade mais que tudo. Talvez, a verdade esteja mais manifesta conscientemente numa obra artística escrita, como um romance, uma antologia de contos, poemas, etc. Não sei. Mas, às vezes me sinto mais livre e alcançando mais a verdade vendo um quadro, lendo um livro, que uma tese. Não quero ser chato nesse momento, nesse pileque, não quero discutir com você metahistória, nem criticar Hayden White ou coisa do tipo. Não, na verdade, queria que você ouvisse minha voz nesse momento, um tanto embargada por causa de um bichano qualquer. Por causa de relações tão fraternais. Os amores de dente de leão que a gente convive, vive, desvive, transborda. A verdade pulsa num poema. A verdade vive na Literatura. O conto fala mais. O conto me livra de mim. A crônica é invenção da mentira... divagações, eu sei. Amo vocês igualzinho. Feito um menino. Para sempre.

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Para o Aquino Neto

Este ano voltei à vida. Mentira, nunca deixei de viver. Mas, estou mais livre do que nunca. Foda-se. Interpretem como quiserem, as vozes que ecoam de mim são muitas. Foda-se. Esse ano publiquei razoavelmente bem um monte de coisas disso e daquilo outro e minha publicação de maior orgulho foi num Zine chamado Linhas Tortas (clica aqui se você tem Facebook e fé na arte que vem via Correios) tocado por um grande amigo meu aqui de Aracaju, chamado Aquino Neto, vegetariano, ciclista, McGyver e que corria descalço um tempo atrás. É meu irmão. Tiramos onda juntos no ano que se vai viajando de pedal apenas com dois isotônicos e uma barra de cereal: vamos de pedal hoje, man? E íamos.
As coisas da vida, as merdas da vida me mergulharam em merda, me afundei em merda e atrasei minhas pedaladas, fiquei estressado, a coisa desandou e mandei os chatos, caretas, covardes, para a mesma merda que a minha e a coisa tende a melhorar... Quem sabe?
A questão é que publiquei no Linhas Tortas do Zé Aquino, filho do Zé Aquino, contador de causos para mim no Augusto Franco e neto do Zé Aquino que trabalhava na Ferrovia quando havia ferrovia e irmão de algumas pessoas e irmão do Yuri (sobre o Yuri escrevo semana que vem, tenho duas artes dele agora e divulgo semana que vem, vocês precisam ver as artes do Yuri e dos amigos do Yuri e dos amigos dos amigos do Yuri. O Yuri também anda de pedal e coloca sua arte nos muros e coloca sua arte na vida ou a vida na arte, coisa assim).
Fazia meses, muitos meses que o Neto me pedia um texto: me dá um texto. Dô. E não dava. Sei lá cargas d’água o motivo. Ele roubou, bandido safado, eu disse a ele: também existe ladrão vegan, seu Puto. Ele roubou uma nota minha no Facebook. Que maravilha! Hoje fui à sua casa e ele me deu o 49 de 100 do volume #3. Quando cheguei em casa (eu já havia visto a publicação pela internet) chorei um bocado como chorei e choro vendo “Três irmãos de sangue”. Na verdade, choro à toa.
De tudo que publiquei este ano, o que mais me orgulhou foi estar no Linhas Tortas com meu “LIBERDADE E BICICLETA” que eu escrevi em homenagem a um monte de gente que eu amo e ao Syd Barrett que esbarrei um dia de bicicleta em Cambridge quando eu ia comprar pão. Mentira. Mas o que é a verdade? Acho que foi um sonho, mas nos esbarramos sim, sei que nos esbarramos em algum momento.

Axé!


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