Há aproximadamente quatro anos, mais especificamente, em 2004, uma série de homenagens foram prestadas ao cantor e compositor Francisco Buarque de Hollanda. Seus 60 anos de idade comemorados naquele ano, foram passados em revista, por uma exposição na Biblioteca Nacional, uma série de programas e, dentre outras coisas, uma coletânea de ensaios e artigos assinados por diversos nomes ligados a inúmeras áreas como: jornalismo, história, literatura, teatro, etc.
O livro, organizado por Rinaldo Fernandes,[1] intitulado Chico Buarque do Brasil: Textos sobre as canções, o teatro e a ficção de um artista brasileiro, é na minha opinião, até esse momento, uma das mais completas reflexões sobre a vida e obra de Chico Buarque. Contudo, pelo incrível que pareça, não é sobre o livro ou Chico que alçarei vôo nesse texto.
No artigo Num fiapo de tempo: Chico, Sérgio e Benjamim, presente no livro, Pedro Meira Monteiro inicia seu texto relatando uma das muitas lendas que envolvem o cantor e seu pai, o historiador Sérgio Buarque de Holanda, autor de Raízes do Brasil. Resumo aqui sobre o que se trata. Chico ao relembrar sua infância e seu relacionamento com seu pai, destaca que uma das memórias mais presentes é o som da máquina de escrever do historiador, sempre em movimento no escritório, sempre emanando os famosos sons, que, talvez, os jovens de hoje não consigam discernir. Essa lembrança não é tão singular na família dos Buarque de Holanda, revendo pela milionésima vez a cine biografia de Sérgio Buarque de Holanda, observei também ser essa uma das recordações narradas pela cantora Miúcha, filha mais velha do falecido historiador.
Eu poderia ficar aqui horas e horas resenhando o livro sobre Chico, poderia viajar nas histórias narradas no documentário, ou mesmo displicentemente, algo recorrente aqui nos textos do Ventríloquo, esquecer o brilhantismo textual, perder o tino mais uma vez e falar sobre o impacto que teve em mim a famosa tese sobre o homem cordial, lançada no mesmo livro que alçou Sérgio como um dos maiores, ao lado de Caio Prado Jr. e Gilberto Freyre, pensadores sobre a formação do nosso país: o famoso Raízes do Brasil.
Contudo, mesmo em tempos de pós pós-mordenismo(?), ainda se faz necessário manter uma certa coesão nos pensamentos postos no papel, no nosso caso: no espaço virtual.
Voltemos ao anedotário, essa pequena grande introdução, é apenas para desenvolver o que mais me interessa nesse momento: os sons da infância. Os sons que Chico Buarque e Miúcha relatam se lembrar de quando ainda eram crianças é o barulho ora pausado ora continuo da máquina de escrever de seu pai. Após rever o documentário, fiquei abismado de como as coisas podem ir se perdendo no tempo e tentei resgatar os sons da minha infância e me surpreendi como eles também estão intrinsecamente associados ao meu pai e como estamos às vésperas do dia dos pais, eis aqui minha homenagem.
O mais antigo dos sons que carrego comigo e confesso agora não serem tão mais constantes era o barulho de suas chaves na estante. Me recordo que esse era o sinal de que me pai havia chegado em casa. Era uma estante grande que não sei o fim que teve. Conforme as mobílias foram sumindo o som também foi se modificando. Hoje as mesmas chaves se quedam na mesinha de centro da sala. Claro que com o passar do tempo a vida também vai mudando e meu pai carrega consigo novos sons como um forte suspiro de cansaço de mais um dia vencido.
Outro som que esteja onde eu estiver me traz o cheiro da infância, as brincadeiras de rua, o futebol de várzea, enfim, é o som de um forte assobio. Quando, aos poucos, a liberdade foi sendo me dada, impreterivelmente, era assim que meu pai me chamava no fim da escadaria que atravessava nosso quintal e, indubitavelmente, lá ia eu, por vezes azedo, voltando para casa, que ficava, confesso, alguns poucos metros de onde eu brincava.
É, alguns sons por mais simplórios que pareçam, ficam conosco para o resto de nossas vidas, ali, martelando, ora o peito, ora a alma, e como cantou Gilberto Gil: Já não somos como na chegada, o sol já é claro nas águas quietas do mangue, derramemos vinho no linho da mesa molhada de vinho manchada de sangue.[2]
E me pergunto: nessa mudança toda, quais serão os sons das crianças de agora?
O livro, organizado por Rinaldo Fernandes,[1] intitulado Chico Buarque do Brasil: Textos sobre as canções, o teatro e a ficção de um artista brasileiro, é na minha opinião, até esse momento, uma das mais completas reflexões sobre a vida e obra de Chico Buarque. Contudo, pelo incrível que pareça, não é sobre o livro ou Chico que alçarei vôo nesse texto.
No artigo Num fiapo de tempo: Chico, Sérgio e Benjamim, presente no livro, Pedro Meira Monteiro inicia seu texto relatando uma das muitas lendas que envolvem o cantor e seu pai, o historiador Sérgio Buarque de Holanda, autor de Raízes do Brasil. Resumo aqui sobre o que se trata. Chico ao relembrar sua infância e seu relacionamento com seu pai, destaca que uma das memórias mais presentes é o som da máquina de escrever do historiador, sempre em movimento no escritório, sempre emanando os famosos sons, que, talvez, os jovens de hoje não consigam discernir. Essa lembrança não é tão singular na família dos Buarque de Holanda, revendo pela milionésima vez a cine biografia de Sérgio Buarque de Holanda, observei também ser essa uma das recordações narradas pela cantora Miúcha, filha mais velha do falecido historiador.
Eu poderia ficar aqui horas e horas resenhando o livro sobre Chico, poderia viajar nas histórias narradas no documentário, ou mesmo displicentemente, algo recorrente aqui nos textos do Ventríloquo, esquecer o brilhantismo textual, perder o tino mais uma vez e falar sobre o impacto que teve em mim a famosa tese sobre o homem cordial, lançada no mesmo livro que alçou Sérgio como um dos maiores, ao lado de Caio Prado Jr. e Gilberto Freyre, pensadores sobre a formação do nosso país: o famoso Raízes do Brasil.
Contudo, mesmo em tempos de pós pós-mordenismo(?), ainda se faz necessário manter uma certa coesão nos pensamentos postos no papel, no nosso caso: no espaço virtual.
Voltemos ao anedotário, essa pequena grande introdução, é apenas para desenvolver o que mais me interessa nesse momento: os sons da infância. Os sons que Chico Buarque e Miúcha relatam se lembrar de quando ainda eram crianças é o barulho ora pausado ora continuo da máquina de escrever de seu pai. Após rever o documentário, fiquei abismado de como as coisas podem ir se perdendo no tempo e tentei resgatar os sons da minha infância e me surpreendi como eles também estão intrinsecamente associados ao meu pai e como estamos às vésperas do dia dos pais, eis aqui minha homenagem.
O mais antigo dos sons que carrego comigo e confesso agora não serem tão mais constantes era o barulho de suas chaves na estante. Me recordo que esse era o sinal de que me pai havia chegado em casa. Era uma estante grande que não sei o fim que teve. Conforme as mobílias foram sumindo o som também foi se modificando. Hoje as mesmas chaves se quedam na mesinha de centro da sala. Claro que com o passar do tempo a vida também vai mudando e meu pai carrega consigo novos sons como um forte suspiro de cansaço de mais um dia vencido.
Outro som que esteja onde eu estiver me traz o cheiro da infância, as brincadeiras de rua, o futebol de várzea, enfim, é o som de um forte assobio. Quando, aos poucos, a liberdade foi sendo me dada, impreterivelmente, era assim que meu pai me chamava no fim da escadaria que atravessava nosso quintal e, indubitavelmente, lá ia eu, por vezes azedo, voltando para casa, que ficava, confesso, alguns poucos metros de onde eu brincava.
É, alguns sons por mais simplórios que pareçam, ficam conosco para o resto de nossas vidas, ali, martelando, ora o peito, ora a alma, e como cantou Gilberto Gil: Já não somos como na chegada, o sol já é claro nas águas quietas do mangue, derramemos vinho no linho da mesa molhada de vinho manchada de sangue.[2]
E me pergunto: nessa mudança toda, quais serão os sons das crianças de agora?
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