Há
tempos não ouço – ou talvez ouça demais – vozes para além da minha. Para bem de
toda a verdade, ela existindo ou não, a voz de Jorge Amado, prestes a completar
80 anos, em 1992, quando foi publicada a primeira edição de Navegação de Cabotagem: Apontamentos para um livro de memórias que jamais escreverei, me
acompanhou nos últimos dias. Claro, numa edição luxuosa, posfácio de Lêdo Ivo,
edição comemorativa ilustrada com fotos, documentos, capa dura, publicada em 2012,
pela Companhia das Letras.
Conhecia
passagens do livro. Foi marcante quando publicado. Conhecia passagens do livro
através de reproduções das memórias nele contatas em conversas de mesa de bar
com um professor meu na faculdade de História – Jorge Amado ainda estava vivo (apesar
de ainda estar vivo) quando eu ingressei no vestibular.
Mas
nunca li por inteiro um romance desse ilustre baiano das terras do cacau. No
máximo, uma passagem aqui, outra acolá nas aulas de literatura no Segundo Grau,
hoje, Ensino Médio.
Comprei
Navegação... ironia do destino, duas vezes. A primeira é mais importante,
numa pequena e resistente livraria-vende vinis e cds na Rua Fonte dos Bois, no
Rio Vermelho, em Salvador. Por sinal, bem próximo da famosa casa da Rua
Alagoinhas, número 33, no mesmo bairro. Disse que comprei duas vezes. Sim! Não
pestanejei quando vi num site desses conglomerados que estão afundando essas
pequenas livrarias-vende vinis e cds. Quando a caixa chegou (o livro é o que
chamamos de um verdadeiro caramalhaço – vida agitada a de Jorge) me dei conta
que já tinha uma edição verdadeiramente baiana, soteropolitana, banhada de dendê.
Como livro não se vende quando já o temos, dei de presente para um amigo.
Apaixonado
fiquei. Li degustando, fechando os olhos, relembrando depois que fechava a capa
dura. Deitava-me na cama e nas minhas insônias recorria às lembranças e
histórias de Jorge Amado pelo mundo, por Sergipe, pelo Rio de Janeiro, por
Salvador, pelo Brasil afora.
Atrasava
afazeres, aumentava as horas só para ler mais e mais, mesmo que já soubesse o
fim do livro. Todo livro de memórias de um já morto que continua vivo é duro de
se ler, acredite você que me ouve. Mas a navegação, ou melhor, o mar que
navegamos a cada parágrafo do Seu Jorge Amado faz ou refaz-nos entender o
Brasil de ontem e de agora. Coisa dura de se enfrentar: a realidade do ontem
continuando no amanhã que é hoje.
Decidido
coloquei as mãos nas parcas economias, afinal, como diria a
economia:
livro é coisa de gente rica. E por ordem cronológica de publicações de seus livros
decidi comprar as edições – sorte a Editora Companhia das Letras ter uma coleção
intitulada JORGE AMADO, cujo Conselho Editorial é composto por Alberto da Costa
e Silva e Lilia Moritz Schwarcz (quem tive a oportunidade de assistir alguns
cursos quando de viagens como estudante de História e também já graduado).
Assim
que me refiz do fim do livro de memórias de um homem prestes a completar seus
80 anos e que passaria oito anos depois, às vésperas de completas 89 anos de
idade, em 2001, me surpreendi. Que vida! Que final de livro. Surpreendeu-me pela candura como se encerra.
Assim,
hoje, 15 de julho, iniciei a leitura do primeiro romance do jovem de 18 anos –
O país do carnaval – publicado em 1931, antes mesmo dele completar seus 19
anos, mas já atento às mazelas desse grande pedaço de chão que chamamos – ou chamaram
por nós – de Brasil. Salve Jorge, que sejas sempre amado. Axé!
Um comentário:
Grande Jorge!
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